Quem conseguisse reunir as cartas que se trocavam entre as famílias açorianas e os familiares que emigraram para o Brasil e, mais tarde, para os Estados Unidos, ficaria de posse de um extraordinário acervo sobre a história destas ilhas.
Muito embora não fossem assíduas as cartas, pois os meios de transporte eram raros, nem por isso deixavam de levar daqui, não só as notícias da família mas igualmente das ocorrências que se haviam dado nos tempos anteriores.
Basta ler a “Carta para Longe”, (in “Em Louvor da Humildade”- 1924) de Armando Cortes Rodrigues, para se ter uma ideia muito aproximada do que eram essas missivas cheias de saudades imensas, pois as famílias de cá não deixavam de transmitir aos que haviam partido, as notícias dos mais simples acontecimentos.
Tal como as tradicionais cartas, principiava o poema:
“Maria! Estimarei / Tua saúde e dos teus/ Pois a nossa, ao fazer desta, / É boa graças a Deus”.
E continuava dando as mais simples notícias, quer da própria casa, quer da família e dos vizinhos:
“O craveiro do balcão / Já se secou, coitadinho.../ Faltou-lhe a luz dos teus olhos / E o modo do teu carinho”.
Deste jeito eram as cartas para Longe como escreveu o consagrado Poeta e Literato.
Havia escreventes habituais. Respondiam com certa graça às cartas que vinham das terras de imigração e muitas vezes aproveitavam para dar notícias da escrevente e dos acontecimentos, por vezes, os mais díspares. Mais assíduas eram as cartas dos Estados Unidos e do Canadá.
Do Brasil eram poucas e cada vez iam rareando mais. Até havia o ditado: O Brasil é a terra dos esquecidos. E esquecidos porque, passados uns tempos, os que lá estavam imigrados, esqueciam a terra e a própria família. Poucos eram os que voltavam à terra. Que me lembre, apenas uma ou duas famílias cá vieram. Uma por cá ficou e passou a ser conhecida pela terra para onde havia emigrado.
Uma questão psicológica que interessante seria averiguar, pois é sabido que existem nas terras de Santa Cruz imensos descendentes de açorianos, desde os históricos Casais – cerca de quarenta – que emigraram para Santa Catarina aquando das erupções vulcânicas do século dezoito e, depois, para outras regiões. Alguns deles fixaram-se mais tarde no Uruguai, onde ainda existe uma colónia de descendentes açorianos que há poucos anos fundou uma sociedade açoriana-uruguaia, para defesa da língua portuguesa, como rezam os respectivos estatutos.
E todos eles, quer no Brasil quer no Uruguai, tem muito orgulho em serem descendentes de gentes emigradas destas ilhas. Mas só.
Existem “Casas dos Açores” em diversas cidades do Brasil, algumas com grande actividade, como seja a “Casa dos Açores” do Rio de Janeiro.
O mesmo acontece agora no Canadá, onde se encontram dezenas de associações com sedes próprias, fundadas pelos imigrantes portugueses e açorianos. Só em Toronto, consta-me, há mais de duas dezenas.
Afinal, as Casas dos Açores proliferam por toda a parte onde se haja fixado um grupo de açorianos.
A de Lisboa, por certo a mais antiga, tinha inicialmente a denominação de “Grémio dos Açores”, fundado em Março de 1927.
Não são de esquecer as seculares sociedades, “União Portuguesa do Estado da Califórnia”, fundada em 1880 pelo picoense António Fontes, e a “Sociedade do Divino Espírito Santo”, também fundada pelo picoense Pe. Manuel Fernandes, conjuntamente com outros imigrantes, em 1896, ambas da Califórnia. Em New Bedford existia o “Montepio Português”. Mas não somente estas. Outras mais há, como a “Casa da Saudade”.
Servem elas, meritoriamente, para conservar vivo o espírito e as tradições das terras de origem, desde as matanças de porco até às festividades do Espírito Santo, não esquecendo os Santos Padroeiros das respectivas localidades de origem.
E, não só as sedes sociais, algumas de grandeza enorme, tenha-se presente a de Mississauga, Canadá, como até os belos e modernos Templos, quase sempre providos de clero português.
De referir também a Imprensa portuguesa, mantida com entusiasmo em terras da Diáspora. É o caso da Califórnia e de Massachusetts. Só na Califórnia, até 1979, fundaram-se vinte e seis periódicos. Lá existem ainda jornais portugueses desde longa data. Outros, embora portugueses na sua origem, já utilizam a língua estrangeira.
E há ou houve programas portugueses na Rádio e na Televisão. Lembro aqui o programa Castelos Românticos iniciado em 1930 pelo nosso conterrâneo Arthur Ávila e esposa Celeste Ávila, o qual teve grande audiência entre a comunidade portuguesa da Califórnia.
Não posso ir mais além. O assunto, de tamanho que é, transcende os limites de um texto jornalístico.
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